COMBATENTES MORTOS E ABANDONADOS
Caros Amigos
Falar dos combatentes mortos e abandonados em campas
degradadas e sem o mínimo de dignidade é falar dum assunto que me toca
profundamente. E só por isso vale a pena dirigir-me a todos vós, já que está em
causa a vergonhosa falta de respeito para com os nossos companheiros de armas.
Em primeiro lugar, nunca deveriam ter sido
abandonados, porque partiram da sua Pátria na convicção que cumpriam o dever
patriótico imposto pelos governantes e regressavam ao seio da família. Por
cobardia dos respectivos comandantes ou por razões logísticas impossíveis de
ultrapassar, mais de 3.000 desses combatentes mortos foram enterrados nos mais
diversos locais das antigas colónias. Quando em missão no norte de Moçambique
assisti a situações de abandono dos mortos, protestei e consegui mobilizar
cerca de 200 companheiros para exigir ao comandante do batalhão de Mueda que os
três pára-quedistas do meu grupo, mortos numa emboscada, e mais cinco militares
do Exército, mortos no rebentamento de uma mina anti-carro, fossem depositados
em urnas apropriadas para os trazer para Portugal. Decorria o ano de 1966,
tempos complicados para reclamar, mas conseguimos que não fossem depositados no
cemitério de Mueda.
Analisando os acordos de paz com os Movimentos
independentistas dos antigos territórios ultramarinos, conclui-se que os
“nossos” negociadores se esqueceram duma cláusula elementar em qualquer acordo
de paz: O REPATRIAMENTO dos mortos em combate. Desde aí, jamais algum
governante se preocupou com o assunto. É o desprezo pelos familiares e
companheiros dos que “ficaram para trás”.
Quando começamos a indagar sobre a situação, viemos a
saber que a Liga dos Combatentes tem gasto do orçamento do Estado cerca de 208
mil euros por ano, para tratar das campas dos “nossos” mortos abandonados em
África. Quando alguns antigos combatentes se deslocam a esses novos países
lusófonos ficam completamente revoltados com a vergonhosa degradação dos locais
das campas. Outros testemunhos de cooperantes (professores, missionários,
funcionários de organizações de apoio e familiares de retornados que vivem
nesses países) dizem que há indícios de sessões de “magia negra” dentro dos
cemitérios das principais cidades, há campas vandalizadas e rumores de que as
ossadas são vendidas para uso de feiticeiros na Zâmbia e no Malawi, há
populações a reclamar as terras onde se encontram os “nossos” cemitérios. Há
construções dentro dos cemitérios e por cima das campas. Tudo isso se passa sem
que o governo português tome uma atitude digna, mantendo uma apatia que nos
repugna.
Fazendo uso dos acessos privilegiados à comunicação
social, a Liga dos Combatentes tem tentado enganar o povo português quanto às
dificuldades em trazer para Portugal os restos mortais. Ignorando as dificuldades
económicas e de saúde de grande maioria dos antigos combatentes, optaram por
gastar dinheiro na recuperação dos cemitérios, concentrando as ossadas em
diversos locais da Guiné, Angola e Moçambique, com o argumento do “turismo das
memórias”, onde todos poderemos fazer excursões turísticas. Esta ideia, além da
imbecilidade do seu propósito, é uma deplorável afronta aos combatentes, ainda
mais grave quando vem de gente altamente responsável em cargos do estado.
O Movimento Cívico de Antigos Combatentes está
consciente de toda a situação e constata que o dinheiro já gasto, sem qualquer
resultado visível, era suficiente para resolver a questão financeira; para as
questões logísticas, temos a colaboração das autoridades e colectividades
locais de cada país. Haja boa vontade e conjugação de esforços e teremos
resolvido este assunto de âmbito nacional, tranquilizando a consciência dos
camaradas de armas dos abandonados!
Contra os apregoadores de que devemos pura e
simplesmente deixar tudo como está, porque “é uma honra morrer e ficar
enterrado no campo de batalha”, nós dizemos: esse argumento só mostra a
ignorância de quem o afirma, porque as savanas e os trilhos das matas africanas,
onde aconteceram as emboscadas e rebentaram as minas, não se podem comparar com
as planícies das Ardenas ou da Normandia da Europa. Muitos desses arautos
defensores dos inoperantes generais que usam recursos do Estado, em deslocações
e viagens, gastando o dinheiro que poderia ajudar no resgate dos nossos
companheiros, são conhecidos comandantes ao tempo dos acontecimentos, que se
acobardaram e, como tal, também são responsáveis por muitos dos mortos terem
ficado abandonados.
Joaquim Coelho, membro do Movimento Cívico de Antigos
Combatentes-2009
Repórter de guerra
COMBATENTES MORTOS E ABANDONADOS
Quando os
poderes instalados nos diversos patamares da governação do país fingem
desconhecer o sofrimento das centenas de milhar de traumatizados pelos efeitos
dos dramas vividos na guerra colonial, é tempo dos Combatentes mostrarem a sua
indignação e protestarem activamente. Estamos fartos de pantominas nas coisas
sérias.
São cada
vez mais evidentes as acções políticas no sentido de amordaçar e desprestigiar
os cidadãos portugueses, reduzindo-os a simples máquinas de trabalho ao serviço
dos interesses malignos da globalização. Tudo isso põe em causa os valores
patrióticos pelos quais os Combatentes deram o melhor da sua juventude ao
serviço da Pátria; como vão perdendo o medo de recordarem o negrume de muitos
dias de carências de toda a ordem, já se afoitam a atirar algumas pedras contra
o charco da ingratidão a que foram votados. Integrados na sociedade
pós-descolonização e, apesar dos seus dramas pessoais, trabalhando na qualidade
de assalariados, empresários ou emigrantes, fizeram-no com o sentido de
contribuir para um Portugal melhor. Agora, é tempo de combater todas as
injustiças que os atingem só por causa de terem sido “os melhores homens da
Pátria”, em determinado período da história contemporânea.
Estamos
certos de que alguns elementos da sociedade que nos acusaram de todos os males
que a descolonização lhes tenha causado são os mesmos “colonos bacocos” que nos
hostilizaram enquanto combatentes, ignorando a força dos “ventos da história”
que mudou as relações entre os povos. Até já lançaram a atoarda de que a
questão do regresso dos mortos divide os combatentes vivos; os que aceitam que
os restos mortais dos nossos companheiros continuem em terras “estrangeiras”
devem fazer parte do lote dos cobardes, desertores e traidores à pátria ou
ignoram que a dignidade duma Nação está na forma como trata os seus mortos em
combate.
Mas, a
razão suprema da nossa indignação é saber que os dirigentes da Liga dos
Combatentes, à semelhança dos governantes, continuam a tratar os combatentes
mortos e abandonados, em cemitérios provisórios e campas degradadas, como os
restos mortais dos seres mais reles e indignos da nação. A missão empreendida,
por um grupo de “antigos combatentes” e a União Portuguesa de Pára-quedistas,
para trazer de volta à Pátria e aos respectivos familiares os “mortos de Guidage-Guiné”
trouxe ao conhecimento público a vergonhosa acção da Liga dos Combatentes.
Primeiro, usou de diversos artifícios para abortar a missão, incluindo a
chantagem diplomática; depois, aproveitou o dinheiro angariado por esse “grupo
de combatentes e amigos” para tratar da trasladação ao seu modo: viagens e mais
viagens e muita burocracia. Há dois anos que andamos com este caso e não sabemos
quando os restos mortais desses combatentes chegarão à terra das suas famílias.
Sabemos que,
as centenas de milhares de Euros orçamentadas anualmente para a Liga dos
Combatentes, vão sendo gastas em viagens “turísticas” às terras de África. Os
Boletins da Liga dão conta de algum “trabalho” em prol dos cemitérios… Mas os
testemunhos dos combatentes que tiveram condições para visitar “as terras onde
perderam muitos dos sonhos da sua juventude” demonstram o inequívoco abandono e
total degradação dos locais onde ficaram “os nossos companheiros mortos”. “A
LIGA NÃO ESQUECE!”, mas gasta o dinheiro sem resultados.
Braga, 10-05-2012
Joaquim Coelho in “O Veterano de Guerra”
MORTOS EM COMBATE
- O SINDROMA DA COBARDIA
Tal como já
demonstrámos ao falecido General Lopes Camilo, numa digressão a Pemba (Porto
Amélia), lembramos ao Excelentíssimo Senhor General Chito Rodrigues que não
vale de nada pagar para pintarem umas tantas pedras desconexas das campas já
destruídas se, no essencial, ninguém garante a limpeza periódica e a segurança
das sepulturas. São os jornalistas e as autoridades locais que alertam para o
tráfego de ossadas em terras de Moçambique. Quanto a Angola, quando nos
deslocámos ao antigo Cemitério Novo, corremos sérios riscos de sermos
molestados, já que as gentes locais não vêm com bons olhos a visita de
portugueses para constatarem a criminosa destruição dos mármores da entrada do
Cemitério e das centenas de campas existentes naquele local. Não fora a coragem
do taxista que nos acompanhou e teríamos sofrido represálias.
Temos em Portugal
um conjunto de responsáveis que um dia responderão pelos gravosos prejuízos
causados à Pátria, porque nada fizeram para restituir os mortos aos respectivos
familiares e têm desprezado os combatentes que lutam para sararem as mazelas
provocadas pela guerra. É mais uma amostragem da sua cobardia e incompetência
como chefes.
Escudados atrás de Instituições públicas,
manipulam a opinião pública e os poderes em função dos seus interesses
mesquinhos e antipatrióticos, numa campanha indecorosa e triste contra os
princípios e valores duma Pátria digna dos seus combatentes mortos e
abandonados na lonjura das terras africanas.
È por causa de
pessoas deste calibre que a Liga de Combatentes, servil da política dos
cobardes do Ministério da Defesa, vai liderando a ideia aberrante da
“Conservação das Memórias”, gastando muitas dezenas de milhares de Euros em
deslocações e estadias de “veraneio” de pessoas nada interessadas na resolução
definitiva da questão dos mortos e abandonados. Sabemos que seria muito mais
económico e seguro transladar para Portugal os restos mortais existentes em
campas devidamente identificadas, mas percebemos que isso acabaria com as
“férias pagas” para um conjunto de pessoas que estão a servir-se dos bens do
Estado, numa total afronta e desrespeito dos companheiros de armas dos que
morreram em campanha.
As notícias e
testemunhos recolhidos nos países onde se encontram esses restos mortais
referem duas situações importantes que é urgente tratar: as autoridades locais
não garantem qualquer tipo de segurança contra a profanação e destruição das
campas e as populações exigem que esses locais lhes sejam restituídos para outras
utilizações rentáveis. Por isso, mostram-se colaborantes para ajudar na remoção
das ossadas dos nossos “mortos” com destino a Portugal. E, se não houver uma
acção urgente nesse sentido, daqui a pouco não haverá nada para resgatar.
10 de Junho de 2009
Joaquim Coelho
Sem comentários:
Enviar um comentário